Controle ESD
A WATCH Tec ASSISTENCIA TECNICA possui um laboratório completamente protegido contra Descargas Eletrostáticas proporcionando total segurança durante a manutenção dos relógios de seus consumidores. Para melhor compreensão do que é descarga eletrostática ou controle ESD, destacamos uma matéria da revista Saber Eletrônica Industrial – ano 48 N°466 de Dezembro 2012.
Eletrostatic Discharge: Saiba como as descargas eletrostáticas podem comprometer a lucratividade da sua empresa.
É realmente incrível o potencial destrutivo das descargas eletrostáticas em um sistema eletroeletrônico. Esse fenômeno até já ganhou um nome: ESD = Eletrostatic Discharge, e já foi alvo de pesquisas profundas em todo o mundo. A razão principal dessa preocupação com a ESD é que os seus efeitos podem ser sentidos diretamente no “bolso” das empresas. A intenção deste artigo é estudar um pouco as descargas eletrostáticas, seus efeitos, precauções e, principalmente, explorar algumas soluções para que esse “fantasma” não comprometa os lucros da sua empresa, ou mesmo sua performance como técnico de serviços.
Alexandre Capelli
O que é ESD?
Antes de discorrermos sobre as descargas eletrostáticas, vamos entender melhor o conceito de “carga estática”. Fisicamente, a carga estática de um corpo é a quantidade de cargas elétricas armazenadas por ele. Essas cargas elétricas formam uma fonte de energia potencial. Quando esse corpo, porém, aproxima-se de outro com energia potencial diferente dele, poderá ocorrer uma descarga elétrica (faísca). Isso acontece porque, devido à diferença de potencial entre os corpos, a energia potencial armazenada em um deles transforma-se em energia cinética entre ambos. Podemos concluir, portanto, que o fenômeno do acúmulo de carga estática não danifica os circuitos eletrônicos, pois se trata de uma energia sem movimento (potencial). Mas, quando essa energia é dissipada na forma de uma descarga (ESD), a corrente elétrica gerada, sim, pode danificá-los.
O corpo humano, principalmente em climas secos, tem grande capacidade de armazenar cargas elétricas. Na verdade o corpo humano, eletricamente, pode ser representado por um capacitor de 20 pF em série com um resistor de 100 kΩ. Isso significa que, na essência, não passamos de um “snubber de 80 kg”. A figura 1 ilustra a forma aproximada das linhas do campo elétrico que emana de uma pessoa.
Mas, qual a magnitude do potencial elétrico que uma pessoa pode acumular?” A tabela 1 mostra como o potencial elétrico é diretamente proporcional à umidade relativa do ar. Esse conceito é fácil de entender pois, quanto maior a umidade relativa, maior é a condutividade do corpo em relação à terra. O processo de descarga, portanto, fica sensivelmente otimizado.
A descarga elétrica depende de dois fatores principais para ocorrer: a magnitude (valor) do campo eletrostático armazenado, e a rigidez dielétrica do meio. Portanto, 1500 volts (por exemplo) poderá ser potencial suficiente para gerar uma ESD em uma situação, enquanto que 20000 volts não, em outra.
Problemas causados pela ESD
Todos os componentes eletroeletrônicos podem ter sua integridade comprometida com a ESD, mas os semicondutores são os mais sensíveis, principalmente os de tecnologia MOS (Metal Oxide Semicondutor). A figura 2 apresenta a estrutura de um transistor MOS em corte, onde podemos notar que a camada de óxido, por ser extremamente fina, pode ser perfurada pela ESD.
A ESD pode gerar dois tipos de problemas: falhas catastróficas (ou imediatas), ou degradação.
Falha catastrófica
A falha catastrófica ou imediata, como o próprio nome sugere, “queima” o componente de forma integral, e acontece imediatamente após a descarga (ou durante a mesma). Um exemplo típico desse fenômeno pode ser observado todos os dias, até mesmo nas grandes indústrias, onde uma placa (comprovadamente boa pelo Setor de Qualidade) chega ao cliente queimada, após ter sido transportada ou instalada sem as devidas precauções.
Degradação
Não podemos nos iludir, pois o fato da placa citada no exemplo acima ter chegado ao cliente aparentemente em bom estado, não significa que danos não foram causados, mesmo ela funcionando bem. Isso é o que chamamos de degradação.
A degradação, ao contrário da falha catastrófica, transcorre lentamente, e seus efeitos podem ser sentidos até mesmo meses após ocorrida a ESD.
Imaginem que uma placa eletrônica possua circuitos integrados CMOS, e esteja sofrendo múltiplas descargas elétricas devido ao manuseio errôneo. Essas ESDs podem não ter capacidade de destruir por completo, em um primeiro momento, a camada de óxido de um transistor interno de um CI qualquer dessa placa. Porém, podem danificá-la parcialmente. Dependendo das condições ambientais, principalmente da temperatura, a placa poderá funcionar bem, mesmo com a parte danificada. Entretanto, uma vez que essas condições mudem, ou que a solicitação da área danificada da placa aumente, ela pode apresentar a falha.
Resumindo, a degradação por ESD causa a morte prematura dos componentes eletrônicos, diminuindo o MTBF do sistema. A tabela 2 mostra a suscetibilidade à estática dos principais semicondutores.
Técnicas de proteção
Nas últimas duas décadas os fabricantes de componentes eletrônicos vem desenvolvendo técnicas de proteção interna contra ESD. A utilização de diodos (principalmente zeners) internos ao transistor é um exemplo clássico (vide figura 3). Isso ajuda muito, e facilita o manuseio dos componentes. Os colegas contemporâneos da década de 70 devem se lembrar de como era difícil manusear um transistor ou CI MOS naqueles tempos. O transistor era fabricado com seus terminais (dreno, fonte, e gate) interligados por um anel condutor. Como os três terminais estavam em curto-circuito, não havia d. d. p. entre eles. O único detalhe importante era não esquecer de retirar o anel com um alicate de corte após a montagem e, obviamente, não tocar em toda a placa também. Os Cis vinham “embalados” em papel alumínio, pela mesma razão.
Embora, hoje, os componentes sejam desenvolvidos com um caráter mais robusto, a ESD ainda poderá vencer as proteções internas. Portanto, a seguir, apresentamos algumas técnicas que consideramos para diminuir o risco de queima ou degradação das placas eletrônicas.
Pulseira e manta dissipativa
A técnica mais popular para quem trabalha em bancada, seja ela produtiva ou de service, consiste na pulseira e na manta dissipativa. A figura 4A mostra uma manta dissipativa, já a figura 4B apresenta um exemplo onde podemos notar o punho da funcionária conectado a uma pulseira em manta dissipativa, que, por sua vez, está aterrada.
Essa técnica é eficaz, porém, aplica-se apenas para a pessoa que está sentada na bancada.
Uma vez que a ESD é gerada através do atrito com o ar e o solo, caso essa pessoa desconecte a pulseira para transportar a placa eletrônica de um ponto a outro dentro da fábrica, os componentes poderão sofrer degradação pelo caminho.
Calcanheira
Um modo do funcionário permanecer “descarregado” é utilizando a calcanheira condutora, conforme ilustra a figura 5A, B e C. Desse modo, a cada passo, o corpo descarrega-se evitando o acúmulo de cargas no deslocamento. É importante salientar que, mesmo com a calcanheira, ao se sentar, a pessoa deverá conectar a pulseira novamente.
Ionizadores de ar
O ionizador de ar é um dispositivo gerador de cargas elétricas positivas e negativas, que são lançadas ao ar através de um pequeno ventilador.
Como as cargas são geradas em uma mesma quantidade, as cargas dos materiais isolantes são neutralizadas. Antes de optar pela compra desse dispositivo, entretanto, é bom observar qual a porcentagem de ozônio (O3) que ele gera. Quanto menor ela for, melhor será o dispositivo, pois o ozônio é tóxico. Também vale a pena verificar se o ambiente permite esse tipo de equipamento.
Testador de aterramento
Existem vários equipamentos no mercado que podem checar o “aterramento” dos funcionários antes de entrarem no setor produtivo.(figura 6) Uma vez que cada um já esteja com a calcanheira, através do toque o equipamento libera ou não a entrada por meio de sinais luminosos (vermelho – não permitido, verde - permitido).
Caso a entrada seja bloqueada, o funcionário deverá ajeitar a calcanheira até que sua resistência para a terra seja satisfatória (figura 6B).
Para quem produz placas ou equipamentos eletrônicos, e deseja qualidade, esse equipamento é fundamental.
As técnicas explicadas acima, na essência, referem-se a produção e manutenção eletrônica. Não devemos esquecer que o transporte e armazenamento também são etapas críticas do processo. As placas eletrônicas devem ser acondicionadas em “sacos” blindados (veja na figura 7), e os Cis em canaletas antiestáticas ou espumas condutivas de acordo com a figura 8. Somente quando a pessoa estiver devidamente aterrada é que os dispositivos poderão ser desembalados.
Cuidado para dois “pecados” mortais
Eu já presenciei (várias vezes) técnicos sem proteção antiestática (pulseiras, calcanheiras, etc.) manuseando placas eletrônicas segurando-as pelas bordas (sem tocar no circuito impresso) com os “dedos” em posição como se a placa estivesse “quente”. Essa prática não é eficaz! A ESD poderá ocorrer mesmo sem o contato direto com as trilhas da PCI, portanto, evitem essa “não conformidade técnica” (para não dizer “mancada”). Também deveremos atentar para a qualidade e tecnologia dos dispositivos protetores de ESD. Muitos deles, embora ainda comercializados, já estão ultrapassados tecnologicamente. Novos materiais e conceitos geométricos foram desenvolvidos nos últimos cinco anos. É importante verificar se o seu fornecedor já oferece essa nova tecnologia em proteção.
Conclusão
Controlar a ESD no ambiente industrial não exige grandes investimentos em recursos físicos. O principal desafio é conscientizar todos sobre o assunto e, através de constante treinamento, mostrar que o controle da ESD influi diretamente na qualidade do produto e, consequentemente, na lucratividade da empresa. De fato, convencer o almoxarifado que um saco de bolhas é diferente de um saco blindado para embalar uma PCI somente é possível através de uma política de qualidade. Por essa razão, podemos afirmar que o investimento em recursos humanos será bem maior do que o físico.
Matéria originalmente publicada na revista Saber Eletrônica; Ano:48; N°466; dez– 2012